Estudo de Caso: Estratégias em Caso de Dolo Eventual no Júri


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Este estudo de caso analisa um julgamento que reacende uma das discussões mais complexas do direito penal: a fronteira entre a culpa consciente e o dolo eventual em crimes de trânsito com resultado morte.
Nos tribunais, essa distinção tem impacto direto na vida do acusado. Enquanto a culpa consciente implica a previsão do resultado com a confiança de que ele não ocorrerá, o dolo eventual envolve a aceitação de que o resultado pode acontecer, ainda que o agente não o deseje diretamente. Em casos de acidentes de trânsito, essa linha tênue costuma ser o principal ponto de controvérsia, pois o comportamento de quem dirige sob efeito de álcool, em alta velocidade ou de forma imprudente, desafia a interpretação jurídica entre o erro e a assunção de risco.
A dificuldade reside em demonstrar ao júri se o agente apenas previu o possível resultado, acreditando que poderia evitá-lo, ou se, de fato, aceitou o risco de produzi-lo. No plenário, essa distinção teórica precisa ser traduzida em narrativa compreensível, o que exige estratégia, método e clareza na exposição dos fatos.
O caso analisado foi conduzido pelo advogado Rodrigo Faucz, e mostra como a organização estratégica das provas e o uso de recursos visuais contribuíram para fortalecer a argumentação defensiva de forma técnica e precisa.

Imagem de @priscillakavalli, Instagram.
Versões em contraste
O réu foi acusado de homicídio na direção de veículo automotor após um acidente que resultou na morte de uma motociclista. O episódio gerou interpretações opostas sobre o que de fato aconteceu.
Para o Ministério Público, ao conduzir sob influência de álcool e em velocidade acima do permitido, o motorista assumiu o risco de causar o resultado fatal, caracterizando dolo eventual, isto é, quando o agente prevê a possibilidade do resultado e ainda assim aceita que ele ocorra.
Já a defesa apresentou outra leitura. O acusado admitiu ter ingerido bebida alcoólica, mas negou a condução temerária. Reconheceu-se, com base no laudo pericial, que o veículo trafegava a aproximadamente 93 km/h, contudo, sustentou-se que a colisão ocorreu porque a vítima realizou uma conversão repentina à esquerda, sem sinalizar, interceptando sua trajetória.
O ponto central do caso era demonstrar que não houve aceitação consciente do risco, mas apenas um erro de avaliação diante das circunstâncias do acidente, caracterizando crime culposo e afastando a configuração do dolo eventual.
Em casos como esse, a dificuldade não está apenas nas provas, mas na forma de apresentá-las ao júri, de modo que os jurados compreendam a diferença entre prever e aceitar o resultado. Foi nesse contexto que a defesa estruturou uma estratégia visual, em conjunto com a equipe da Lawtta, para reforçar o raciocínio técnico e tornar os elementos fáticos mais claros e compreensíveis.
O desafio cognitivo do Júri
Julgar um crime de trânsito com resultado morte envolve um problema de tradução: converter conceitos abstratos como "assumir o risco" ou "prever o resultado" em imagens mentais compreensíveis. Como já exploramos em artigo anterior, a forma como informações são apresentadas impacta diretamente a memória, a atenção e a decisão dos jurados.
Além disso, lidar com um acidente fatal, amplamente repercutido e percebido inicialmente como um evento trágico, coloca uma pressão extra sobre a narrativa. No plenário, contudo, a análise detalhada revelou que o desfecho não foi resultado de um único fator, mas sim de ações que envolveram ambos os participantes, mostrando a complexidade da situação.
Quando o raciocínio depende apenas da palavra falada, a compreensão do jurado se fragmenta, especialmente em temas técnicos como:
Distância percorrida
Velocidade no momento do impacto
Ângulo de colisão
Campo de visão dos envolvidos
Essa fragmentação cria uma lacuna entre o que precisa ser compreendido e o que efetivamente é assimilado pelos jurados. A ausência de clareza visual mantém conceitos técnicos em território abstrato, dificultando a formação de um convencimento sólido e fundamentado sobre os fatos.
Reconstituição 3D: traduzindo dados em visualização
Nesse caso, a reconstituição 3D reproduziu a dinâmica do acidente, baseada nos elementos dos autos:
Posição das motocicletas
Ações da vítima
Campo de visão
Distância percorrida
Relatos testemunhais
Um dos aspectos explorados visualmente foi a autocolocação em risco, conceito que permite discutir o grau de contribuição da vítima no resultado. A defesa demonstrou que, no instante da colisão, a manobra inesperada da motociclista ao adentrar a pista contrária rompeu o nexo causal direto entre a conduta do motorista e o resultado fatal. Essa construção foi fundamental para sustentar a ausência de dolo e a caracterização da culpa consciente.
Por que isso importa?
Esse recurso é especialmente importante em casos de acidente de trânsito porque traduz elementos técnicos e espaciais em linguagem visual compreensível. Distâncias, velocidades, ângulos de visão e trajetórias se tornam tangíveis, permitindo que jurados avaliem a viabilidade das versões apresentadas sem depender exclusivamente de descrições verbais.
O que antes dependeria de longas explicações se torna visível em segundos, reduzindo a margem de ambiguidade cognitiva.
Infografia Jurídica: estratégia em formato visual
Além da reconstituição, foi desenvolvida infografia jurídica para apoiar a sustentação oral. O material pode organizar visualmente conceitos doutrinários e suas distinções técnicas, facilitando a compreensão de categorias abstratas que estruturam o raciocínio penal.

A função da infografia é tornar acessível o que normalmente permanece abstrato. O diagrama funciona como um mapa conceitual que:
Orienta o raciocínio
Reduz a carga cognitiva
Permite que a argumentação oral se desenvolva sobre uma base visual compartilhada
Assim, a defesa sustentou sua tese com apoio visual e jurisprudencial, mantendo precisão técnica sem depender exclusivamente da oralidade. A infografia permitiu que jurados acompanhassem o raciocínio jurídico de forma estruturada, tornando o argumento mais acessível sem perder sua profundidade.

Um voto fez a diferença
O júri reconheceu a tese defensiva por 4 votos a 3, desclassificando a conduta para crime culposo e afastando a imputação de dolo eventual.
A diferença de um único voto comprova a complexidade da discussão: diante da divergência entre as teses apresentadas, a compreensão técnica dos fatos pelos jurados se torna decisiva. Foi justamente nessa margem estreita que os recursos visuais mostraram sua relevância, tornando compreensível o que dificilmente seria assimilado apenas pela oralidade.
Nesse contexto, a clareza com que as informações técnicas são apresentadas deixa de ser apenas um diferencial e passa a ser determinante para a formação do convencimento. O que antes dependeria de abstrações verbais tornou-se visível, compreensível e, ao final, decisivo.
A dimensão ética da visualização
A imagem, quando usada de modo responsável, não simplifica o direito. Ela o explicita. No plenário, a função de uma reconstituição ou infografia não é persuadir pela emoção, mas sistematizar o conteúdo probatório.
A clareza visual aprimora o contraditório porque torna as provas mais compreensíveis para os jurados. Quando o jurado compreende o que está sendo julgado, a decisão tende a ser mais consciente e menos influenciada por impressões subjetivas.
Por isso, cada elemento visual precisa ser ancorado em dados dos autos, respeitando veracidade e proporcionalidade da representação.
A atuação da Lawtta na Produção Visual de plenário
A produção de júri desenvolvida pela Lawtta nesse caso integrou duas frentes complementares:
Reconstituição 3D: reprodução fiel da dinâmica do acidente a partir de dados periciais, croquis oficiais e depoimentos, permitindo a visualização precisa de trajetórias, velocidades, distâncias e pontos de impacto em formato tridimensional
Infografia jurídica: organização e aprimoramento de elementos técnicos do processo, como laudos periciais, registros fotográficos, diagramas de acidentes, mapas e outras evidências, para que sejam representados de maneira visual e didática
A equipe multidisciplinar da Lawtta trabalhou em estreita colaboração com o advogado responsável durante todo o processo. Cada decisão visual foi tomada em conjunto para garantir que a representação servisse à estratégia de defesa sem sugerir conclusões que as provas não sustentassem.
Considerações finais
Casos como esse demonstram que o futuro da advocacia criminal passa pela clareza visual. Não se trata de substituir o argumento oral, mas de aprimorá-lo com elementos que favoreçam a compreensão dos fatos e dos conceitos. Quando bem utilizados, recursos como reconstituições e infografias transformam o plenário em espaço de entendimento racional, não apenas de impacto emocional.
A visualização jurídica é um método de pensamento. Ela exige técnica, estratégia e domínio da narrativa factual, mas devolve algo essencial ao julgamento justo: a possibilidade de compreender o que se julga.
Na Lawtta, a forma é tratada como ciência. Nossa atuação vai além da produção de materiais visuais: adotamos uma abordagem multidisciplinar que amplia o alcance estratégico da comunicação. Não apenas tornamos informações visíveis, mas asseguramos que sejam transmitidas da maneira mais clara e persuasiva possível. Cada detalhe importa quando há método, inteligência e fundamentos técnicos aplicados para potencializar a performance do advogado.
Se você também acredita que a forma faz toda a diferença, entre em contato conosco e descubra como nossas soluções podem transformar seu caso.
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Autor
Helena Peruch
Responsável pelo marketing jurídico da Lawtta. Especialista em Direito Digital, Gestão da Inovação, Propriedade Intelectual e Direito Público. Desenvolve soluções criativas e informativas voltadas ao universo jurídico, com foco em conectar estratégia, conteúdo e tecnologia para profissionais do setor.
Publicado em
17 de out. de 2025
Categorias
Direito
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